segunda-feira, 30 de março de 2009

o sétimo

Passo o dia fingindo não perceber. Me concentro nas atividades matinais, nas caminhadas pelo bairro e até consigo valorizar a possibilidade de poder sentar num banco de praça e observar crianças, cachorros e velhos.
Mas a verdade é que, por mais que eu tente, há sempre algo que me faz lembrar: hoje é domingo.
Quando percebo, já fui tomada por uma melancolia estranha e familiar. Realizo as atividades sociais com certa dificuldade, meu rosto transmite um pesar descansado. É o recolhimento habitual e é necessário respeitá-lo.
Há um misto de nostalgia, ansiedade e dor. Percebo aos domingos que o tempo anda passando, que as escolhas precisam ser feitas e que o mundo caminha, não se preocupando se eu já estou pronta (não estou, como de costume).
Hoje é dia de admitir que vai ser assim mesmo. O cabelo meio despenteado, a palidez de uma tarde em casa e os apertos costumeiros de uma vida que segue sem que eu me dê conta.
Chico Buarque lançou livro novo, minha listinha aumenta e aquele filme saiu de cartaz.
O que eu vejo fica comigo e hoje eu preciso mais de mim do que antes.
só, aos domingos...

(também é dia de insônia).

quarta-feira, 25 de março de 2009

confissão número 1

Eu confesso:
tenho desejos de provar do outro
ter a sensação do corpo do outro
enchergar o mundo com outros olhos.

Mas não consigo.
às vezes sinto que fui. Quase;
e logo me percebo sendo eu novamente

então eu invejo o outro,
julgo,
compito,
e volto a habitar a parte que eu menos gosto de mim,
a menos idealizada
a mais humana e mais concreta
volto a ver o mundo nas mesmas proporções,
com as mesmas cores,
os mesmos cheiros

sigo tentando,
e desejando
frustradamente

segunda-feira, 23 de março de 2009

pequenos prazeres

dobrar e guardar as roupas amontoadas
jogar papéizinhos fora
incenso
bossa nova
banho demorado
cortar as unhas dos pés
Nara Leão, Cássia Eller, Elis e Clarisse
almoço na casa da tia
sorvete de chocolate
Rock
Os Mutantes
céu de brigadeiro
e finalmente te dei uma gaveta do meu armário
(e um poeminha)

aos pequenos prazeres de uma segunda-feira

quinta-feira, 19 de março de 2009

velhinhos

No cruzamento de uma rua movimentada, uma velhinha na esquina se amparou num poste. Seu olhar era desses de atravessar o que vê, como se não reconhecesse o lugar ond se encontrava. Até que num ímpeto decidiu atravessar. Estava na faixa de pedestres, mas provavelmente não sabe que hoje em dia, em tempos de selva de concreto, essas coisas não dizem muito.
Naquela ladeira seu caminhar era tão inseguro que foi ficando difícil acreditar que conseguiria chegar até a outra ponta. Seu tronco às vezes parecia ceder à gravidade.
Foi dando seu passinhos curtinhos, e me causando uma ansiedade enorme. Levava à mão um bloquinho de notas que eu logo imaginei ser o endereço da sua missão. Pensei que seria mais vantajoso guardar o bloquinho na bolsa e arranjar logo uma bengala.
Quase chegando na outra ponta, avistou um novo poste, e isso a incentivou a fortalecer suas pernas, se esticou com a pouca elasticidade dos seus tendões( que também estavam envelhecidos), alcançou o poste e se puxou para a calçada. Ficou alí, amparada novamente pela frieza de um poste publicitário, (felicidade dos cachorros) , um tanto ofegante, olhando através daquele grande caos que a cercava. Achei que estava perdida, mas o semáforo me acenou a luz verde e eu continuei minha travessia sem saber de onde vinha e para onde ia a velha senhora.
Talvez, se fosse uma criança, logo a pegariam no colo e de quebra, ganhasse uma bala. Mas a velhinha é quase invisível, tão frágil que era, tendo dentro de si apenas um soprinho de vida.

quanta crueldade... as ladeiras , os cruzamentos perigosos, os velhinhos ofegantes carregando soprinhos de vida num mundo construídos para jovens, a minha paralisia e a falta de braços para ajudá-los.

quarta-feira, 18 de março de 2009

a chuva

A chuva diz muito sobre a cidade.
Ontem vi o mundo cair do nono andar de um prédio (o Sesc) da Avenida Paulista.
De repente abrem-se milhares de guarda-chuvas. Os pretos se confundem com o asfalto, com a sujeira, com a cidade. Pensei que as pessoas deveriam comprar mais deles coloridos. O efeito é fantástico visto de cima.
Elas apressam o passo, algumas correm... outras, sem proteção, desistem e caminham tranquilamente, se encharcando por aí.
De repente anoitece, o trânsito começa a parar. As luzes dos carros se acendem. De uma lado são todas vermelhas, do outro, todas brancas. É lindo. São dois rios pós-modernos.
A diferença dos rios de antes é que na chuva, fluem com mais dificuldade, ou quase não fluem. Os peixes pequenos de capa preta vão a todo vapor, de um lado para o outro, se arriscando na aventura da sobrevivência.
Até que desci. Os pingos eram gelados e eu não estava provida de guarda-chuva de nenhum tipo, de cor alguma. Logo percebi que a visão debaixo é bem menos organizada, mais caótica e barulhenta do que a de antes. As pessoas não mais parecem andar calmamente e os guarda-chuvas podem se transformam em objetos agressivos.
Caminhei com a tranquilidade de quem conhece o panorama geral, com a visão de cima, me encharcando por aí.

terça-feira, 17 de março de 2009

sobre eternidade

A Cássia não devia ter ido...
a sua voz ecoa em mim fortemente. E eu fico escutando os mesmos discos, os mesmos discos, os mesmos...
e não me canso, e imagino como seria o seu próximo...

sim, as pessoas são eternas
e não faço parte de nenhum fan-clube

sexta-feira, 13 de março de 2009

das feridas

É preciso des-sensibilizar-se
para não viver em carne viva o tempo todo.
a fina camada protetora torna-se necessária.
mas eu quero na medida. Fina o bastante para rasgar vez ou outra.
Porque sangrar é importante, curar é transformador e as cicatrizes são nossas histórias.

para os corações apertados

quinta-feira, 12 de março de 2009

exageros

É comum me sentir agredida. A reação vem, normalmente, da maneira mais cliché: eu choro. Quando gritaram "Burra!!!" no trânsito, quando um homem cinquentão olhou para além do seu limite, quando me corrigem insistentemente nas aulas de dança... só piora quando as correções são de ordem subjetiva.
Mas ultimamente o reflexo tem sido outro: eu me revolto.
Não que tenha parado de chorar, mas, logo após a última lágrima é possível sentir o calor vermelho que nasce de dentro da minha barriga e que me transforma em bicho.
À sua virilidade exagerada eu respondo com minhas delicadas perturbações.

sexta-feira, 6 de março de 2009

das dificuldades

eu dificilmente tenho certeza das coisas.
essa é uma dificuldade.
vale a meu favor
e me deixa muitas vezes sem graça, cheia de humanidade, insuportável.
e no fundo eu acho (e não tenho certeza) que na verdade, eu não sou assim.

quarta-feira, 4 de março de 2009

no meio

Desde ontem mantenho um certo apertinho no peito. Apertinho, sabe como é... Aquela quase vontade de ... enfim
Começo do ano é sempre um tanto confuso. Sim, porque o ano começou há apenas uma semana. São tantas as opções de vida no mercado que fica difícil escolher a minha. Que caiba em mim. Normalmente sou levada pelos outros. Ouvi dizer que isso não é muito bom de se fazer.
Fica difícil medir o que de fato é importante neste momento, agora. Eu costumo me dar conta do tamanho das coisas em retrospectiva. Fica claro que as segundas-feiras do ano passado eram deliciosas. Mas já faz um ano e eu não sei o que fazer das minhas quartas-feiras. Porque na segunda eu repito a dose.
Hoje é quarta-feira,
tem apertinho,
não sei se é sinal para ir, ou se é para ficar. Se caso ou compro uma bicicleta, se ligo ou desligo, se acalmo ou acelero.
É bem no meio da semana. Montanha abaixo ou montanha a cima?

terça-feira, 3 de março de 2009

medo

A vida às vezes me dá medo, desses que quase me impedem de pegar no sono a noite e de acordar de manhã no dia seguinte. Como se ao pisar para fora do colchão os perigos da vida fossem caminhando em minha direção.
Costumo associar prazer e dor. Quando se anula a dor, o prazer é automaticamente anulado. Como quando naqueles remédios anti-depressivos que vão te anulando aos poucos, deixando você e tudo ao seu redor cinza, monocromático, sem brilho, sem dor, sem prazer.
E nesses dias de medo, já se sabe, serão grandes prazeres e grandes dores.
Dá vontade de não sair da cama, ou de tomar uma pilula mágica e ver a vida passar.
Mas a escolha é sempre pela aventura.
Os carros na rua começam a buzinar, o sol entra pela fresta da janela, meu coração dispara, sinto as primeiras dores do dia. Me preparo.
Que venha mais um. dos prazeres ainda não sei, mas costumam doer para aparecer.

segunda-feira, 2 de março de 2009

sobre monstros

Sempre quis... mas daí apareceu o título e não pude me negar a tentar.
Aqui está!
do meu equilíbrio instável surgem, surgirão, estas para compartilhar. Porque quando postadas, parecem mais reais e me dão falsa e prazerosa sensação de estabilidade. Para poder me lançar para a vida e suas cordas bambas.
A aventura atual são os monstros. Aparecem em sonhos me apavorando ao puxarem meus pés por debaixo do edredon. Outras horas sou eu, conscientemente, que os crio. Porque também sou muito monstro. e estão todos eles dentro de mim.
Ame-os, assim como às princesas. Assim amará verdadeiramente.
dentro também é meu,
dentro também sou eu
eu e meus monstros.

Prazer, esse é meu Blog!