domingo, 29 de novembro de 2009

janela

Olhos semi-cerrados
formam-se aos poucos
contornos
sob luz tímida de outro canto.

Aqueles dois sapatos posicionados ao meu lado são testemunhas do meu caminhar até aqui, com pernas próprias.

Olhos entre-abertos
refaço as imagens da cidade amanhecendo.
Pelos meus olhos passam tantos e molham os meus
nos seus
vejo e não vejo
apagam-se contornos
nos cachos do cabelo bagunçado
gotejam comigo
a serenidade da cidade,
o que em mim,
de mim
serena.

Arregalem-me, olhos
para que luz de outro canto adentre.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Na magreza
pouca pele entre nós
é possível sentir meu pulso.

O seu
pausa,
o meu
vôo.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

pretere

Deixam de te olhar e você finge uns dois balançar de ombros largados num respiro final.
Finalizado.
Você estampa um sorriso amarelo, produz gargalhadas regadas à alcool, acelera o passo duro, o corpo duro, os olhos duros.
Prefere não comentar.
Quer colocar o coração num pote grande, com cubos de gelo, para sentir o frescor.
-Prefere não comentar?
-Prefiro.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

palavra e meia

Queria escrever
em letras garrafais,
com jatos gordos de tinta preta,
num muro ainda branco,
uma palavra bem grande.

Para tirar do corpo
e me atirar no muro
em cima de palavrão,
vazar preto do ódio
embate mudo duro na carne.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Mania a minha
querer ver
belezinha,
bem-aventurados,
bem-intensionados.


Até os bem-casados
tem acúcar cristalizado.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

ao calor do sol e da lua estouraríamos
numa explosão única e audível
possíveis seriam
escamas
ou asas.
Então, por que pernas?

terça-feira, 3 de novembro de 2009

prólogo para pó

Tive nessa noite algo de crise verborrágica, de excesso mesmo, redundante mesmo. Tentei dar forma em forma de escrita de garranchos no meu caderninho delicadamente guardado sobre o criado-mudo ao lado da cama. Na mudez do criado, paciente na escuta, alguns partos de partida prá quem onde sabe chego. Prá onde, quem sabe, chego. Prá quem chego onde sabe-nos. Prá quem chega e me parte.

Palavra palavra palavra palavrapalavrapalavra,
solto aos poucos, sem certeza de interlocutores. Vocês, se existem, não me deixam saber. Silensiosos ao som dos meus dedos em dígitos me abandonam no generoso espaço vazio, potente pelo o que ainda não sabemos. Prossigo. Mais um pouco, mesmo sentindo o tempo da morte se aproximar lentamente: a textura da minha leitura, meu leite que derrama, acho que tem prazo final.
Então sirvo, ainda quente, em bandeja fria e lustrosa:
deleitem-me.


(Permitida a primeira garfada, delicadeza no corte, por favor. Sigam em goles longos.)